Akasha - Capítulo 4
A nave submarino pousou em Tzun, o planeta dos zadkeun, a espécie de Dazimok.
A área de Tzun aonde eles estavam possuía uma forte influência do Budismo, com uma grande área cercada por um muro de pedra. Dentro dela havia uma série de templos com telhado curvado para cima.
Árvores coloridas preenchiam boa parte da área, com o perfume de suas flores adocicando o local. Também haviam muitos zadkeuns caminhando ou voando pela área, alguns parando pra alimentar estranhos animais que viviam lá.
Ana ficou sem palavras diante de tanta beleza.
— É muito bonito aqui. — Comentou Douglas com um sorriso no rosto.
— Obrigado. — Respondeu Dazimok — Estamos trabalhando para que um dia o planeta inteiro seja assim.
— Muito bom. A propósito, o que vocês vão fazer com os bois que abduziram da Terra? Só agora me dei conta de que vocês não devolveram.
— Vamos abater e vender a carne.
— Ah. — Douglas não esperava aquela resposta. — Bom, eu acho que um churrasquinho de vez em quando não faz mal, né? — Tentou brincar.
“O Douglas parece bem mais leve desde que o Jogo Sagrado acabou”, pensou Ana. “Conversar com a tal da Izanami deve fazer muito bem pra ele”.
— Muito bem, vamos para o meu templo. — Disse Dazimok.
*
A tripulação da nave se reuniu em uma sala do templo gerenciado por Dazimok. Era uma sala simples, com decoração minimalista. Douglas e Ana se sentaram em almofadas no chão, de frente para Dazimok.
— Olha, eu não esperava que um planeta aonde o Rei Amarelo venceu pudesse ser tão agradável. — Comentou Ana.
— Fico lisonjeado. — Respondeu Dazimok — Mas como eu disse, essa é apenas uma fração do planeta.
O inseto limpou suas antenas antes de continuar.
— Vocês devem estar com muitas dúvidas a respeito de tudo o que está acontecendo. Acredito que o primeiro passo é explicar um pouco sobre a nossa situação.
— Por favor. — Disse Douglas.
— Bom, há séculos atrás houve uma grande crise sociopolítica nesta parte da galáxia, e um grupo militante de toruns budistas usou isso como uma oportunidade para impor à força a versão deles do Budismo sobre as diferentes espécies do setor, formando o que viria a ser o Império Torum.
Dazimok abriu e fechou as asas.
— Mais tarde houve uma guerra civil pela sucessão ao trono, e ambos os candidatos acabaram mortos. Isso abriu caminho para mais guerras, com toruns buscando poder e as espécies dominadas buscando libertação.
— O que é “torum”, afinal? — Perguntou Ana.
— É uma das espécies do setor. — Respondeu Plassan, se intrometendo na conversa — Eu sou uma narolet, Dazimok é um zadkeun, Kadmek é um gunetak e Bib e Bob são joidnits. Nós tínhamos uma torun na equipe como piloto da nave, mas ela não conseguiu se encaixar, então foi dispensada.
Houve um pouco de silêncio. Douglas encarou o oratório atrás de Dazimok, aonde se encontrava o seu Gohonzon.
— E quanto a eu ser um Buda? Vai me explicar sobre isso?
Dazimok riu de leve.
— Sim, já estava nos meus planos. Você é a reencarnação de um bodisatva torum que existiu há muito tempo atrás, bem antes da crise acontecer. Nós o conhecemos apenas como “O Bodisatva Distante”. De acordo com uma das escrituras, ele estava destinado a alcançar a iluminação após renascer em um mundo distante, como filho de uma deusa da morte.
Douglas demorou um pouco para absorver a informação.
— Uau… Alguns deuses da Terra já me disseram que sou a reencarnação de um alien, mas ouvir isso dos próprios aliens é um negócio que eu não sei o que pensar. Me sinto virado do avesso.
Ana colocou a mão em cima do ombro do ex-peguete.
— Tem uma coisa que eu queria saber — Douglas retomou a conversa — Este planeta está sob influência dos Alkhez, né? Falaram pra gente na Terra que os Alkhez estão acima de todos os deuses. Isso inclui os Budas?
Aquela pergunta chamou a atenção de todos na sala.
— Ah, essa é uma ótima pergunta! — Falou Dazimok, animado. — Tudo o que sabemos é que os Alkhez e os Budas estão em um confronto pela influência do cosmos.
— Interessante. — Comentou Douglas — Uma outra coisa que me deixou curioso: Como é o mundo lá fora? Que tipo de planeta o vencedor do Jogo Sagrado daqui criou? Eu gostaria de conhecer o vencedor também.
Kadmek, Bib, Bob e Plassan se entreolharam.
Dazimok suspirou.
— Kadmek, se importa de escoltar-nos? — Perguntou o inseto.
— É meu trabalho, né? — Respondeu o felino, erguendo seu martelo.
*
— Então é assim que agem os não-budistas de sua espécie? — Perguntou Ana para Dazimok — Olha, vocês são bem… punk.
— Tá mais pra death metal. — Retrucou Douglas, procurando não prestar atenção nos arredores.
—Pensei que vocês estariam mais abalados. — Comentou Kadmek.
—Também tivemos nosso próprio Jogo Sagrado. — Explicou Douglas — Além disso, eu também comungo com entidades do submundo.
—Agradeço a compreensão. —Falou Dazimok. — Oh, vejam só. Já chegamos.
O grupo havia chegado a um edifício no centro das ruas. Era uma espécie de torre feita com pedras e cadáveres, e haviam várias janelas, com vários zadkeuns entrando e saindo por elas voando.
Os quatro entraram pela porta na base da torre.
Dazimok cumprimentou os outros zadkeuns que se encontravam ali, e Kadmek chegou a espantar um que havia se aproximado de Douglas e Ana com más intenções.
—Aqui, subam. —Disse o inseto budista.
Era uma grande plataforma feita de carcaça de insetos, pedra e outros materiais.
Douglas hesitou.
—Isso aí é um altar de sacrifício? —Perguntou Ana, apontando o dedo.
—No momento, não. —Respondeu Dazimok — Essa plataforma os fará se encontrarem com a deusa Bzotak pessoalmente. É uma pena que o terceiro vencedor do Jogo Sagrado na Terra não esteja aqui pra essa confraternização.
Douglas e Ana subiram no altar, e então foram transportados para outro plano existencial.
—Eles vão ficar bem? — Perguntou Kadmek.
—Espero que sim. —Respondeu Dazimok.
*
A princípio, foi difícil para os herois humanos distinguirem baixo e cima, esquerda e direita, mas logo se acostumaram.
—Aqui deve ser um lugar tipo Carcosa. — Falou Douglas.
—Tenho que admitir, tive uma puta inspiração pra um videoclipe agora. — Comentou Ana, olhando ao redor.
—Ah, visitantes! — Bradou uma voz feminina e imponente que parecia vir de todas as direções. —Perdão, permitam-me assumir uma forma física.
O próprio espaço em frente aos humanos se distorceu até que adquiriu a forma de uma zadkeun. Não havia nada de diferente na aparência dela, mas Douglas e Ana podiam sentir a força de sua presença.
—Vocês não são visitantes comuns — Disse a deusa inseto. Ela então materializou cadeiras —Vamos, sentem-se, vencedores do Jogo Sagrado!
—Valeu, — Disse Ana se sentando — Mas eu acabei não conseguindo vencer. Éramos três, mas só o Douglas aqui derrotou o inimigo.
—Impressionante! — Comentou Bzotak — Mas eu não percebo essência divina em você, Douglas. O que foi que você pediu? Que tipo de mundo foi criado pelo seu desejo?
Douglas deu de ombros.
—Nenhum. Eu só pedi pra que as coisas voltassem ao normal.
Bzotak gargalhou.
—Então você é aquele tipo de heroi certinho que só faz o bem sem esperar uma recompensa? Ah, que patético!
—Você cala sua boca! —Bravejou Ana, se levantando —Você não sabe o que ele passou!
—Deixa, Ana. Tá tudo bem. —Douglas tentou acalmar a amiga e deu um leve puxão em sua roupa pra ela voltar a se sentar —A gente já devia esperar algo assim dessa entidade, considerando as coisas que seus seguidores fazem.
Bzotak deu um risinho.
—Eu tô curioso: — Douglas continuou — Se você é uma deusa, por que deixou seu povo ser dominado pelos torum?
Bzotak riu mais uma vez.
—Ai, ai, você é muito divertido, primata. — Disse a inseto. — Os toruns nunca dominaram os zadkeuns. O que aconteceu foi uma simples troca: Nós os fornecemos Cthugas e em troca eles nos presenteiam com seus prisioneiros.
Silêncio. Douglas e Ana se seguraram para não perder a calma.
—Você criou os Cthugas? —Perguntou o rapaz, sério.
—Mas é claro! E como eu amo essas máquinas de destruição! Acho que mais até que os próprios zadkeuns!
—Você não é uma deusa, é um monstro! — Indignou-se Ana.
—Ah, por favor, querida! Eu sou uma deusa, os seres do plano mortal existem pra me servir! Todos não passam de brinquedos pro meu entretenimento!
—Já chega! —Com esse grito, Ana ativou seu relógio conectado à sua alma e se transformou em Madre-Ax, avançando contra Bzotak.
—Mas que interessante! —Comentou Bzotak se esquivando das machadadas da heroina.
Bzotak se esquivou mais uma vez, se posicionando atrás de Madre-Ax e acertando ela pelas costas com dois tegatanas do mesmo lado do corpo.
—Só vai ficar olhando? — A deusa provocou Douglas —Não vai ajudar a sua amiga?
Douglas grunhiu e se transformou em Semreh Magnus, avançando contra Bzotak com sua mão incendiada.
Dessa vez o golpe acertou a deusa inseto em cheio, o tegatana de Semreh Magnus decepou os dois braços esquerdos da inimiga.
—Você definitivamente é um campeão do Jogo Sagrado! —Disse Bzotak, animada — Mas vai precisar de mais que isso pra me vencer!
Como num passe de mágica, os braços da zadkeun se regeneraram.
—Ah, puta que pariu! — Gritou Madre-Ax.
—Madre-Ax, tome! — Semreh incendiou a lâmina do machado da amiga com seu fogo dourado.
Madre-Ax avançou mais uma vez, flanqueando Bzotak.
Semreh Magnus deu cobertura, disparando tiros de fogo dourado na inimiga.
Bzotak foi atingida de raspão pelo machado, mas conseguiu sair do caminho das chamas, que acabaram atingindo Madre-Ax em vez disso.
Madre-Ax não se deixou abalar e imediatamente tornou seu machado em direção aonde Bzotak estava, acertando a deusa com força total.
—Muito bom, mortais! —Disse Bzotak— Podem vir com tudo!
Semreh Magnus e Madre-Ax se apressaram para atacar Bzotak, Semreh com chutes e Madre-Ax com machadadas.
Utilizando seus quatro braços, Bzotak conseguiu se defender com maestria. Mesmo as artes marcias de Semreh não eram páreo, já que ele nunca havia lutado antes contra alguém que possuía dois braços no mesmo lado do corpo.
—Estou começando a me entediar —Comentou a deusa inseto— Vamos acabar logo com isso.
Bzotak abriu suas asas e concentrou nelas uma energia escura vinda do espaço aonde estavam.
Quatro feixes de energia foram disparados em direção a Semreh Magnus e Madre-Ax, fazendo com que se destransformassem.
—Até que foi divertido. — Bzotak falou — Mas agora preciso voltar aos meus afazeres divinos. Tchauzinho!
E com um aceno, Bzotak fez com que Douglas e Ana voltasse pro plano mortal.
*
—E então, como foi? — Perguntou Dazimok.
A equipe estava de volta no templo budista.
—Você tá perguntando isso só agora? —Disse Ana.
Os quatro haviam caminhado todo o caminho de volta da torre de Bzotak ao templo, e Dazimok não tocou nesse assunto em nenhum momento.
—Fiquei com medo da resposta, então esperei voltarmos pra cá. —Explicou o inseto. — Pode ser que os outros zadkeuns não gostassem de ouvir, o que nos daria problemas.
—Já se sentem melhor? — Foi a vez de Kadmek falar. O gunetak estava curando as feridas de Douglas e Ana, Dazimok também achou que era melhor não atrair a atenção dos outros zadkeuns pra isso.
—Estou ótimo! — Respondeu Douglas.
—Com todo o respeito, Dazimok, — Começou Ana — Mas essa deusa de vocês é uma tremenda filha da puta! Não é a toa que a sua espécie faz aquelas merdas que a gente viu na rua!
Silêncio.
—Sim. — Disse Dazimok — Bzotak pode ser a deusa do nosso mundo, mas ela ainda é regida por desejos mundanos, assim como a maioria dos de minha espécie. Nós zadkeuns budistas trabalhamos para que Bzotak um dia se converta e se torne uma presença mais agradável.
—Hum...—Resmungou Douglas, com a mão no queixo — Quando eu me tornar Buda, eu vou ter capacidade de influenciar essa deusa, certo?
—Vale a pena tentar! —Animou-se Dazimok — Mas antes você precisa entender uma coisa: Você carrega um karma negativo enorme por ter matado seu próprio pai no Jogo Sagrado da Terra, então precisaremos consultar a Buda da Destruição, pra que ela se livre disso e permita que você se ilumine.
—Sim, claro. Respondeu o rapaz.
—Só tem um problema: O único templo aonde podemos consultá-la está em Chiky-Ah, o planeta aonde ficava a capital do império antes da guerra.
—Putz, disse Ana.
—De qualquer forma — Continuou Dazimok—Precisamos passar em um outro planeta primeiro.
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